Não me conformo com o que não concordo.
Não concordo com o que não entendo.
Não entendo o que não me é explicado, passo a passo se preciso for.
Não me acostumo com o que não me excita, não me provoca, não me tira o ar, o fôlefgo, não dá frio na espinha, o que não ecoa em minha cabeça enquanto o sono não vem.
Não me tira o sossego e faz todos os dias serem a tranquilidade de domingo.
Não me acostumo com o que não me irrita, não dá choque em meus neurônios, não me induz a pensar.
Não me acostumo com dias iguais, tudo repetidamente, tudo sempre igual. Às vezes tem uma variante, mas no fundo é sempre igual. Só mudou a ordem dos fatos. Ou quem sabe, um vaso fora do lugar.
Não me acostumo com o que não me impele, não me impulsiona, não me enlouquece a ponto de me fazer procurar de novo pela minha sanidade.
Não me acostumo com tons pastéis, comida morna, meio salto, meia manga, meia 3/4.
Não acostumo com tecidos de poliéster, não aquecem, não atraem, não adere ao meu calor humano.
Não acostumo com meu cabelo baixo, quieto, comportado.
Nem com a minha voz comedida em 100% do tempo.
Não me acostumo com dias nublados sem chuva. Ou chuva sem frio.
Não me acostumo com o total silêncio dentro de mim. Silêncio só é permitido da minha boca pra fora.
Não me acostumo com o médio, o mais ou menos, nem lá nem cá.
Não me acostumo com o que não me tira o chão de vez em quando (de vez em quando) e me impulsiona abrir minhas asas e voar.Com o que me deixa quieta, absorta, inerte.
Contrariando tudo, isso não é equilíbrio. É conformismo. É não arregaçar as mangas e sentar-se esperando a onda passar.
É não ser espontâneo e pular quando se tem vontade. Ou ficar calado, quando não quer falar.
Não me acostumo com o que o ser humano julga por conveniência, quando na verdade é uma gaiola para si mesmo.
(Aline Gobeti)